Pré-fabricados, resistentes e modulares, contêineres de transporte de carga se tornam matéria-prima para a produção de construções residenciais.
Residência em Curitiba é composta por seis contêineres de 2,89 m de altura, 2,44 m de largura e 12,89 m de comprimento.
Pré-fabricados, resistentes, baratos e portáteis, os contêineres de transporte de carga reúnem uma série de características que credenciam seu uso como “matéria-prima estrutural” para a produção de casas. É verdade que a adaptação não é simples: eles precisam passar por um rigoroso processo de seleção e transformação antes de poderem compor as construções, o que exige conhecimento técnico especializado.
O desenvolvimento de detalhes técnicos, como a interface entre os caixilhos e o contêiner, por exemplo, também exige domínio do sistema por parte do projetista. Outra necessidade é a elaboração de um plano de logística para descarregamento e posicionamento do recipiente de carga no terreno. Mesmo com tamanha complexidade, a tecnologia ainda pode se mostrar uma opção economicamente viável em projetos residenciais, com a vantagem adicional de dar novo uso a um material que já havia cumprido com sua função no transporte de cargas.
Os contêineres High Cube de 40 pés que têm 2,89 m de altura, 12,19 m de comprimento e 2,44 m de largura – são os mais empregados na construção de casas em função do pé-direito maior, que favorece, por exemplo, o embutimento das instalações no forro de gesso. Os recipientes usados custam cerca R$ 9,5 mil e, depois de adaptados para a construção civil, têm durabilidade estimada de 90 anos, desde que sejam realizadas intervenções periódicas de manutenção.
“Trata-se de um mercado diferenciado, voltado para as pessoas que querem inovar com algo diferente das construções em alvenaria”, afirma José Eleutério Jardim, diretor do Grupo IRS, empresa especializada na reforma e modificação de contêineres para a construção civil. “Estamos reciclando e dando forma aos contêineres que seriam descartados e se tornariam sucata”, diz Jardim.
Seleção
Os contêineres normalmente chegam à obra parcialmente adaptados, com aberturas recortadas, molduras soldadas (que substituem os contramarcos) e instalações técnicas embutidas. A seleção técnica do produto que será usado no projeto residencial é a primeira etapa do processo, que acontece ainda no terminal de contêineres. “Excluímos os contêineres com ataque químico, problemas estruturais e com tetos danificados”, afirma Ronaldo Hultmann, presidente e diretor geral da Delta Containers, empresa paranaense que comercializa os recipientes de carga já transformados para projetos arquitetônicos. Os recipientes de carga são examinados e manuseados por mão de obra especializada, treinada segundo os critérios internacionais do The Institute of International Container Lessors (IICL), órgão que estabelece as normas relativas aos contêineres.
Depois de escolhidos, os contêineres passam por serviços de serralheria (corte, solda e moldura). Os cortes, quase sempre feitos por máquinas de plasma com ar comprimido, devem ser executados com precisão para evitar soldas adicionais, causadoras de eletrólise ou problemas estruturais. “Discos de corte ou lixadeiras são usados quando há necessidade de emendar peças que tenham cortes com ângulos de 45o”, diz Pablo Castilho, responsável técnico da Delta.
Após os cortes, segue-se às etapas de limpeza, remoção de graxa e tratamento abrasivo, que é feito com granalha de aço em contêineres novos (com carepa de laminação). “Em outros casos, é feita uma limpeza mecânica com escova e lixadeira rotativas e pistola de agulha. Posteriormente, aplica-se a pintura anti corrosão com sistema airless”, complementa Castilho.
Primeiro projeto
Projeto piloto do arquiteto Danilo Corbas, a casa da Granja Vianna, em Cotia (SP), concebida para ser sua residência, teve boa parte das atividades executadas no canteiro, já que os recipientes chegaram à obra somente com os vãos recortados. “A casa levou sete meses para ser finalizada. Teria levado cinco se todo o material estivesse disponível no tempo da obra e não no dos fornecedores”, justifica o arquiteto.
Na morada do arquiteto, destacam-se uma cobertura verde, que capta águas pluviais para irrigação do jardim, e os grandes vãos e aberturas que proporcionam espaços integrados. “Vencer o vão não foi problema, mas sim a vibração e um provável curvamento, que foi combatido com o posicionamento do corpo da escada e com os pilaretes da caixilharia”, complementa o autor do projeto, que considera a criatividade e a experiência importantes para quem vai projetar ou executar construções com contêineres.
“Se não tiver experiência no campo, o arquiteto deve contar com o respaldo de um engenheiro experiente”, aconselha. Para ele, um dos itens mais difíceis de se lidar em um projeto desse tipo é a interface dos caixilhos com o contêiner, cujo painel corrugado pode repuxar das formas mais inesperadas, dependendo do corte feito. “É possível usar caixilhos convencionais, mas os contramarcos devem ter uma base especial”, alerta.
Quando questionado sobre como seria a base ideal, Corbas evitou dar informações e fornecer detalhes técnicos que elucidassem visualmente o sistema. “Não divulgo todos os detalhes por estratégia comercial”, justifica o arquiteto. O mesmo fez a Delta Containers. “Trata- se de um segredo de produção”, afirma Ronaldo Hultmann.