A venda do edifício do sindicato dos metalúrgicos de Betim no final de 2018 desperta sentimentos opostos no que diz respeito ao projeto arquitetônico. Por um lado, a obra, cuja concepção começou em 2010 por Gustavo Penna e equipe, não cumprirá o seu propósito, pois, embora finalizada em 2016, jamais foi ocupada pelo sindicato. Por outro, o fato de agora estar destinada ao uso por diversos órgãos municipais – a compra foi realizada em sociedade pelo instituto de previdência social do município de Betim (IPREMB) e a prefeitura – atesta a sua polivalência ou capacidade de adaptação

“As virtudes do projeto não são específicas. O prédio sempre esteve aberto a várias interpretações ao longo do tempo”, depõe o arquiteto Gustavo Penna, salientando a qualidade da integração dos espaços internos, tanto horizontalmente nas lajes quanto verticalmente no átrio de pé-direito total, assim como a linguagem arquitetônica, “de gestos grandes”.

De fato, embora o intrincado layout desenvolvido detalhadamente pelo arquiteto – “Optamos por manter o desenho de ocupação dos ambientes nas plantas dos pavimentos porque, ainda que não represente o uso efetivo do edifício, assinala a qualidade da transição das suas escalas, das grandes áreas coletivas para os inúmeros departamentos relacionados entre si” – e equacionado pela transparência das divisórias que deixam passar a luminosidade vinda de fora, o prédio é lido internamente pela lente da amplitude e da conexão dos espaços.

“São suaves, espontâneas, as ligações entre os ambientes. O edifício pode ser apreendido inteiro através do átrio e também horizontalmente há a continuidade espacial, revelando-se já no térreo todas as suas conexões”, diz o arquiteto. Para tanto, conta favoravelmente o projeto estrutural que, através do posicionamento periférico dos pilares e do uso de lajes nervuradas protendidas, gera grandes vãos livres.

Externamente, a arquitetura é marcada por certa imponência, advinda da combinação de elementos como a elevação do edifício em relação ao solo – aflora parcialmente (1 metro) a garagem do subsolo, com a particularidade de que a reentrância no encontro com o chão faz com que a construção pareça carecer de apoios -, o traçado alongado da rampa de acesso ao térreo e as grandes superfícies de geometria regular: o retângulo da fachada frontal e a sombra triangular, resultante da sua ligeira rotação para dentro, e a curva da cobertura.

É também notável a transparência dos fechamentos, sendo a fachada frontal (sul) e a lateral (oeste) conformadas por vidros de grandes dimensões, fixados por meio de garras sustentadas por cabos de aço. A ideia era estimular a integração do edifício – e, portanto, do sindicato – com a cidade.

Mas, embora a sua localização em terreno de esquina junto à avenida que é a porta de entrada da cidade de Betim pela Rodovia Fernão Dias, trata‑se de uma zona de transição urbana, onde convivem pequenos comércios e moradias unifamiliares com edifícios verticais e de comércio e serviços de maior porte. A fachada lateral, então, voltada para rua de pequeno fluxo, é recoberta externamente com painéis de chapa metálica perfurada que servem de filtro – solar inclusive – visual entre fora e dentro.

Essa pele metálica é solta da fachada de vidro – sua sustentação ocorre através de barras horizontais fixadas na espessura das lajes – e tem desenho ondulante, que remete à imagem da “bandeira sindical esvoaçante”, explica Penna. Ainda que tal simbolismo tenha se perdido com a venda do edifício, permanecem os seus efeitos.

Sobretudo a ideia de que a fachada não seja rígida em relação à rua, oferecendo, ao invés, certa imprecisão. “Um véu de chapa perfurada.

Gustavo Penna Arquiteto e Associados

Gustavo Penna (arquiteto formado pela Universidade Federal de Minas Gerais, onde lecionou por três décadas) é o fundador do escritório GPA&A, em Belo Horizonte. Nele, realiza projetos há quase cinco décadas, tendo conquistado prêmios nacionais e internacionais, como o The International Architecture Award, em Chicago, o World Architecture Festival (WAF), em Cingapura, e o Prix Versailles, em Paris. Penna é membro do Conselho Curador da Fundação Oscar Niemeyer e da Fundação Dom Cabral.

Ficha Técnica

Sindicato dos Metalúrgicos de Betim
Local: Betim (MG)
Início do projeto: 2010
Conclusão da obra: 2016
Área do terreno: 2.748,09 m²
Área construída: 6.855 m²

Arquitetura: Gustavo Penna Arquiteto e Associados – Gustavo Penna (autor); Ricardo Gomes Lopes, Norberto Bambozzi, Laura Penna, Priscila Dias de Araújo, Letícia de Paula Carneiro, Vivian Hunnicutt, Alyne Ferreira, Natália Ponciano, Catarina Hermanny (equipe)
Gestão e planejamento: Risia Botrel e Isabela Tolentino
Paisagismo: Junia Lobo Paisagismo
Programação visual: Greco Design
Luminotécnica: Arquitetura e Luz
Acústica: Oppus Acústica
Concreto, metálica, fundação e terraplenagem: Montar Engenharia
Esquadrias: B&M Consultoria em Esquadrias
Impermeabilização: Isolar
Ar-condicionado: Protherm
Orçamento: João Bagno
Construtora: Total Engenharia
Fotos: Jomar Bragança

Fornecedores
Ecotelhado (teto verde);
Permetal (chapa metálica perfurada do brise da fachada curva);
Interface (carpete do átrio e recepção);
Placo (forros de gesso);
Piso Pronto (piso em madeira do auditório e palco);
Deca (louças);
Docol (metais sanitários);
Hunter Douglas (vidros)